quinta-feira, 23 de abril de 2015
Músicos questionam direitos autorais em streaming
A recente ação do Google — que acionou a Justiça brasileira por não entrar em acordo com as editoras de música sobre os direitos autorais de vídeos reproduzidos no YouTube — veio no momento em que um outro debate sobre direitos movimenta artistas e empresários. Membros de organizações como Procure Saber e Grupo de Ação Parlamentar Pró Música (GAP) já se organizam para lidar com o streaming, o serviço de consumo de música que mais cresceu no Brasil e no mundo, segundo dados da Associação Brasileira de Produtores de Discos e da International Federation of the Phonographic Industry, divulgados na semana passada. Hoje, os artistas mal conhecem as regras de remuneração dos streamings. Agora, Procure Saber e GAP querem definir estratégias de atuação para que os criadores sejam informados dessas regras e, a partir daí, busquem que elas sejam justas.
— Ficamos dez anos num limbo, na transição entre entre o CD, que foi o último formato hegemônico, e o streaming, que tudo indica que vai se firmar — avalia o cantor Frejat, integrante do GAP. — Os grandes negócios estão sendo formatados agora. É hora de botar a mão na massa. Se os criadores não se mobilizarem para fazer a coisa valer da maneira mais justa para todos os envolvidos, depois haverá uma deformação que vai ser difícil de corrigir. Nosso primeiro movimento é dar informações à própria classe artística. Depois iremos ao Ministério da Cultura (MinC).
Boa parte da movimentação foi impulsionada por um texto de Carlos Taran, empresário de Dado Villa-Lobos, que já trabalhou com bandas como Legião Urbana e Titãs. O artigo “Precisamos falar sobre o streaming” surgiu de tanto Taran ouvir amigos reclamando que “o streaming paga pouco”. Ao mesmo tempo, ele percebeu que essas mesmas pessoas não conseguiam aprofundar o assunto muito além dessa queixa por desconhecerem como o sistema funciona.
No texto, o empresário explica que a percepção de que as empresas de streaming ficam com a maior fatia do bolo é errada: 70% do faturamento delas é repassado para pagamento de direitos. Por outro lado, o modo como é calculado esse repasse para cada artista (apenas o Spotify torna pública sua equação) segue um mistério, assim como os números efetivos (quantas vezes cada canção foi executada ou o faturamento total da companhia nenhuma delas divulga). Os autores ficariam, portanto, na mesma condição de quem faz um show por 10% da bilheteria e no fim é pago sem que a casa diga quantas pessoas foram ao show.
Quando as companhias de streaming de música (como Spotify, Deezer, Napster ou Rdio, que vendem a seus clientes acesso a milhões de músicas) argumentam que o valor pago por elas aos artistas é melhor do que a pirataria, em que eles não recebiam nada, Taran saca uma metáfora simples.
— É como aquele rapaz que entra no ônibus para vender algo e diz: “eu poderia estar roubando, mas estou aqui trabalhando”. Sim, você poderia estar roubando, mas roubar é errado, assim como a pirataria é errada. Não é porque ele não está roubando que devo comprar dele. Não gosto dessa história de plataformas de streaming se colocarem como alternativa à pirataria e isso dar a elas alguma autoridade moral. O CD também é uma alternativa à pirataria. O que me interessa saber é como esse sistema de streaming remunera os artistas e se isso é justo ou não.
Paula Lavigne, do Procure Saber, concorda que a questão é premente.
— Essa é crise internacional, na qual os criadores estão perdendo em todos os países — diz Paula, numa referência aos diversos conflitos entre empresas de streaming e artistas, envolvendo nomes como Taylor Swift, Thom Yorke e Jay-Z (que lançou um novo serviço, o Tidal, com o discurso de uma remuneração mais justa).
Como Taran em seu texto, Paula também aponta a falta de transparência como uma das questões centrais na remuneração do streaming:
— O primeiro problema é que não há distribuição direta, que é pelo que lutamos. Tocou uma vez, paga uma vez, tocou 30, paga 30. A outra é que nunca conhecemos as bases verdadeiras desse pagamento, ninguém entende como é feita essa divisão dos lucros. Desta forma, não sabemos nem medir se é justo ou não. O streaming pode ser um respiro para a indústria da música, como dizem, mas não pode ser suspiro final para os artistas, para os músicos e compositores.
As operadoras de streaming argumentam que o repasse depende de diversas variáveis e que, com o crescimento provável do número de assinantes do serviço, esses valores irão aumentar.
— Como a renda do Spotify aumenta a cada novo assinante, não há limite fixo para o total de royalties que pode ser gerado. Por isso, não existe um valor fixo para cada música — explica Roberta Pate, responsável na empresa pela relação com gravadoras e artistas. — No Spotify, se a música de um artista representa 1% do nosso fluxo total, esse artista e seus parceiros receberão 1% dos royalties totais. Até hoje, o Spotify já pagou mais de US$ 2 bilhões em royalties a artistas e gravadoras, e esse valor continua aumentando.
Para Max Guimer, diretor de planejamento estratégico e relação com parceiros para América Latina do Napster, o confronto entre a remuneração do mercado antigo e a do novo não faz sentido:
— A forma de consumo é diferente. O consumidor antes comprava um LP, pagava x, levava de oito a 12 músicas e tinha a propriedade daquela mídia para sempre, executando-a quantas vezes quisesse. Hoje ele pode consumir uma música só do mesmo LP, ou quantas quiser, gerando remuneração toda vez em que houver a execução. É um valor fixo (antes) versus uma perpetuidade (agora).
Bruno Vieira, diretor-executivo do Rdio no Brasil, chama a atenção para um nó do repasse:
— Na grande maioria das vezes quem nos licencia o conteúdo são as gravadoras e distribuidoras digitais, e não os artistas diretamente. Então, elas é que possuem a responsabilidade de remunerar o artista, seguindo o contrato existente entre eles.
O problema é que muitos desses contratos (no qual gravadoras ficam com um percentual entre 80% e 90% dos royalties) foram estabelecidos com base na realidade do mercado físico.
FONTE: ORM NEWS
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